segunda-feira, 13 de outubro de 2014

The dark side of the moon - Pink Floyd

O oitavo álbum de estúdio da banda inglesa “Pink Floyd”, intitulado “The dark side of the moon” chegava às lojas no dia 24 de março de 1973. Este disco representa uma mudança de postura em toda a banda, tida como um dos pilares do rock progressivo nos anos 70, com letras pessoais e menos partes instrumentais nas canções, o que era uma marca da sonoridade da banda até então. Por outro lado, o álbum usa e abusa de efeitos sonoros para tornar as faixas bem complexas. A música “Time”, por exemplo, abre com o som de dezenas de relógios, todos ao mesmo tempo, em polifonia.


O disco abrange uma série de temas densos sobre o ser humano, como a ambição, problemas mentais e as consequências da velhice na vida de cada pessoa. Esses temas não foram “escolhidos” em vão pela banda, pois tratam das próprias experiências vividas por Syd Barret, membro fundador do Pink Floyd, que deixara a banda após sofrer de graves problemas mentais.
Ao longo de 1972 e 73, a banda produziu o disco nos famosos estúdios Abbey Road, em Londres, ao lado de Alan Parsons, que deu seu toque pessoal nas bases e elementos eletrônicos das músicas.

Já a famosa capa negra com um prisma ao centro refletindo raios luminosos em diferentes cores como num arco-íris, foi pensada e elaborada como uma representação da grandiosa iluminação usada pela banda em seus concertos, além de caracterizar o intimismo das letras presentes no disco. O conceito também buscava captar uma ideia importante para a banda, a de que a capa deveria ser direta e ao mesmo tempo, marcante.
 

O álbum foi sucesso imediato na Inglaterra, França e Estados Unidos, alcançando as paradas musicas, como a conceituada “Bilboard”, sendo que nesta, o disco já esteve presente em mais de 803 menções ao longo dos anos, o que é um feito na história fonográfica mundial. Críticos e público consideram “The Dark Side of the Moon” como uma das obras mais importantes do rock n’ roll em todos os tempos, tanto pela sua qualidade musical, quanto pela inovação conceitual que apresentou em suas canções e parte gráfica.

Desenvolver novas canções estava nos planos da banda desde a turnê de “Obscured by Clouds”, álbum anterior, e os problemas enfrentados por todos, principalmente devido à saída de Barrett, fizeram com que ainda no meio da turnê, as canções fossem compostas para inicialmente serem apresentadas ao vivo. A necessidade de serem mais objetivos e menos teatrais também aguçou a criatividade dos músicos para novas composições.
Após concluírem as gravações demo em pequenos estúdios improvisados nas casas dos músicos e em um armazém dos Rolling Stones, a banda investiu pesado em equipamentos para produzir as músicas no Teatro Rainbow, em Londres, num projeto chamado “The dark side of the moon”. Contudo, o nome teve que ser mudado para “Eclipse”, pois a banda “Medicine Head” já usara o título escolhido. Destino ou consequência natural, o “Medicine Head” foi um fracasso comercial e o “Pink Floyd” pôde usar o nome inicial para seu novo projeto.

Antes mesmo de lançarem o álbum, a banda iniciou a “The Dark Side of the Moon Tour” e passou por Estados Unidos, Canadá e diversos países da Europa, como forma de desenvolverem melhor suas canções ao vivo. Em 17 de fevereiro de 1972, eles se apresentaram no Teatro Rainbow para uma platéia de jornalistas, recebendo boas críticas.

O Pink Floyd no Abbey Road Studios durante a gravação de “The Dark Side of the Moon”

As gravações iam sendo feitas durante os intervalos entre as apresentações, utilizando a chamada “gravação multicanal” que permitia o agrupamento de vários sons, unindo-os perfeitamente em sincronia e trazendo assim um excelente resultado sinfônico.

Uma curiosidade sobre o longo tempo que duraram as gravações foi o fato de que muitas vezes elas eram interrompidas para que o baixista e principal compositor da banda, Roger Waters, pudesse ir assistir a partidas de futebol de seu time de coração, o Arsenal, ou ao seu programa favorito na televisão, o “Monty Phyton’s Flying Circus”.
Após o término das gravações, a banda se lançou em mais uma turnê pela Europa.



“The Dark Side of the Moon” e “O Mágico de Oz”.


Desde o ano de 1997, circula a “lenda” de que o álbum serve perfeitamente como trilha sonora para o filme “O Mágico de Oz”, de Victor Fleming, lançado em 1939. O chamado “The Dark Side of the Rainbow”, algo como “O lado sombrio do arco-íris’, numa alusão dupla ao filme e à capa do disco, é um “fenômeno” que gera polêmica no mundo pop, com alguns defendendo claramente essa ideia e outros que não encontram relações entre as duas obras.

De acordo com aqueles que defendem essa “tese”, certos pontos do filme sincronizam perfeitamente com trechos do álbum.

Os membros da banda sempre negaram uma relação intencional, atribuindo o fato como simples coincidência. Seja como for, quando o leão da MGM ruge pela terceira vez, depois que a tela escurece e começam as imagens do filme, o disco deve ser iniciado para que a tal “sincronização” aconteça.

De acordo com a “Wikipedia”, estes são alguns dos principais momentos em que o disco ilustra as cenas do filme:
Quando Dorothy cai de cima do cercado em que está se equilibrando, inicia-se a música “On the run” indicando o momento de suspense. Na seqüência a avó de Dorothy aparece conversando, e neste momento é possível ouvir uma voz feminina de fundo na mesma música.
Quando Dorothy está na fazenda e ela olha para o alto, no áudio surge barulho de avião.
Quando a bruxa está chegando de bicicleta para raptar o cachorro de Dorothy, começam a tocar os sinos da música “Time”, análogo aos toques de campainhas de bicicletas.
Em seguida a bruxa estaciona a bicicleta no cercado da casa de Dorothy e, enquanto está parada do no portão, o avô de Dorothy bate com o portão por trás da bruxa. Quando o álbum e o filme estão exatamente sincronizados, nesta batida do portão é tocada a primeira nota da música “Time”.
Quando é cantada a frase “Home, home again” (Casa, casa novamente) do reprise de “Breathe”, o cachorro de Dorothy entra pela janela do seu quarto, após fugir da bruxa.
A música “The great gig in the sky” é tocada no momento de suspense do filme, onde um tornado aproxima-se à casa. É possível perceber os três tempos da música em sincronia com as cenas de suspense, as cenas de sonho/desmaio e com as cenas de calmaria.
O som da caixa registradora no princípio de “Money” (dinheiro) aparece exatamente quando Dorothy pisa pela primeira vez a estrada dos tijolos amarelos; que é também o momento em que o filme passa de preto e branco para cores. Outra referência é a aparição da fada dourada;
No momento em que a bruxa do Oeste aparece, é tocada a palavra “black” (preto);
A cena em que Dorothy encontra o espantalho (personagem que alegava não ter cérebro) é acompanhada pela música “Brain Damage” (dano cerebral), e quando a letra da música começa a tocar: “the lunatic is in my head…” (o lunático está na minha cabeça), o espantalho inicia a dançar freneticamente como um lunático;
O bater de coração no fim do álbum ocorre quando Dorothy tenta ouvir o coração do homem de lata;
No momento em que a bruxa do oeste lança uma bola de fogo contra Dorothy e seus companheiros, a música grita “run!” (corra);
No momento que Dorothy encontra Oz, entra a música “Us and Them”, soando Us como Oz bem quando aparece a 1a imagem de Oz;
Várias frases das letras contidas nas músicas coincidem com os mesmos atos sendo executados pelos atores no mesmo momento;
A duração da maioria das músicas coincide precisamente com a duração das cenas no filme.


Seja pela lenda que criou, ou pela qualidade e originalidade do trabalho, “The Dark Side of the Moon” é parte obrigatória na coleção de todo fã de música, principalmente, rock n’ roll, e deve ser celebrado como uma das obras-primas do Pink Floyd, uma das mais espetaculares bandas de todos os tempos. Hoje, 31 anos após seu lançamento, o disco ainda é uma valiosa e interessante análise do ser humano, sob uma perspectiva muito particular, preenchida por excelentes notas e acordes.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Lightning Bolt - Pearl Jam

É inegável que o Pearl Jam é uma  das bandas  em atividade na cena musical mais influentes dos últimos vinte anos. Em  seu décimo disco, se mantem fiel, acima de tudo, a si mesmos. Eu sei, todos já conhecem “Black”, todos já pularam ao som de “Even Flow” e, no mínimo, arrepiaram-se ao ouvir os primeiros acordes de “Alive”. Mas, no decorrer dos anos,com  a carreira planejada de forma independente e espontânea, o Pearl Jam tornou-se numa banda  atemporal no mundo musical. Apesar de ainda ser relacionada em um primeiro momento e  aos mais desavisados com  a tal “cena grunge”, um olhar  mais atento a carreira dessa banda de Seattle dirá  que eles já se livraram há muitos anos desse rotulo .

O tempo entre Backspacer e Lightning Bolt é um dos mais longos na carreira de Pearl Jam, pouco mais de quatro anos. Esse período, no entanto, foi de grande atividade para cada um de seus integrantes, além da celebração coletiva de vinte anos da banda, que gerou um documentário oficial, o PJ20. Posteriormente, cada um tomou seu rumo e ocupou seu tempo criativamente em outros projetos. Eddie Vedder, por exemplo, embarcou em  carreira solo com seu disco de estreia, Ukulele Songs, de 2011.

 Diante dos  trabalhos paralelos dos integrantes da banda, a impressão que dá é que os quatro anos sem se trancarem no estúdio durou bem mais. O resultado é que os quatro integrantes, acrescido de Boom Gasper(piano), entraram no estúdio no momento ideal e se focaram em produzir o melhor disco, como o próprio Vedder afirmou na época do lançamento em entrevista à Rolling Stone.
Com  Lightning Bolt lançado em outubro de 2013  a banda volta a  arriscar um pouco mais e explora  novos territórios, embora sempre com um pé em solo seguro. “Pendulum”, sombria, com o piano criando o ambiente. O ritmo, no entanto, lembra um pouco “Parting Ways”, de Binaural. Melodia muito bonita, com Vedder mais uma vez com a voz impecável.

 A banda continua explorando e experimentando novos sons, para desespero dos “grungeiros”. Após a experimentação, Pearl Jam volta para a zona de conforto com a mediana e correta “Swallowed Whole”, bem a cara de composição de Eddie. Mas logo em seguida volta a ter ingredientes novos e inesperados, como em “Let The Records Play”, com uma pegada bem blues, coisa que Pearl Jam não havia experimentado ainda, seguimos com “Come Back”,balada lenta também com uma levada blues

“Sleeping By Myself”, embora não seja totalmente inédita, já que figurou em Ukulele Songs, de Eddie Vedder, ganha aqui uma nova roupagem com a banda completa, inclusive, bem country. Ainda assim, no final Eddie ainda empunha seu ukulelezinho de sempre. O clima acústico guia as duas faixas finais, com “Yellow Moon”, misturando com um solo de guitarra bem intenso, embora curto, e “Future Days”, basicamente Eddie, seu violão, e uma base de piano, também tem a  letra mais positiva do álbum.


Lightning Bolt é, por fim, mais um grande registro de uma ótima banda que já superou essa polêmica de tentar fazer um novo Ten ou Vs. É notório que eles estão preocupados apenas em fazer boa música e criar novos sons para comunicar sentimentos. E esse é o espírito da coisa. 

domingo, 10 de agosto de 2014

Clássicos do Rock Nacional; Loki? - Arnaldo Baptista.

Na musica brasileira em geral, são muito raros os casos que driblaram a barreira lingüística e lançaram trabalhos relevantes, O  álbum em questão surgiu não apenas como antídoto a essa tendência, mas também como uma obra FUNDAMENTAL  do rock brasileiro.
Dor. Muita dor. Nem tanto  aquela que parece dilacerar a carne, mas principalmente aquela que queima o coração como um ferro em brasa e carboniza o amor despedaçado.
Há quarenta anos, Arnaldo Baptista colocou tudo isto para fora em um álbum que soa desconcertante e atual  até os dias de hoje. Era seu primeiro disco solo, já fora dos Mutantes. Lóki ? era o sinal de que ele precisava de ajuda para sair de um furacão de delírios lisérgicos e paranoicos  com relação a uma” invasão extraterrestre” e a dor, aquela dor, causada pela perca que ele acreditava na época ser a musa e amor de sua vida; Rita Lee. Mergulhado na depressão, Arnaldo era a personificação da angustiante incerteza de continuar a viver.

Gravado em terríveis condições emocionais, após sua saída dos Mutantes, o álbum conta com a participação de três ex-integrantes (o baterista Dinho, o baixista Liminha e Rita Lee  nos backing-vocals. A gravação feita às pressas nos  proporcionou uma pegada  inigualável e, dado seu estado emocional, Loki? acabou por ser o maior legado existencial do rock brasileiro.
Arnaldo mostrou  o que significa amar até perder a própria identidade , buscar por paraísos artificiais a partir da desintegração da alma e  usos de drogas, percorrer os porões proibidos dos sentimentos, dar vazão aos abismos da alma e anunciar os esboços da morte, mesmo não consumada. Nessas “previsões”, ele já parecia estar ciente de seu destino consumado  por uma tentativa de suicídio em 1980.
Se, literalmente, (ao expor sentimentos) ele  provou genialidade, no nível musical nada deixou a desejar musicalmente ; ou seja, a partir de sua voz arrancada “do estomago” e de um sensível piano clássico, ele percorre o rock  de forma  eclética com maestria, indo das mais tristes baladas até  o rock progressivo , passando por bossa, jazz, funk e blues.
Em cada faixa, Arnaldo dilacera a alma, exibe uma mente já perturbada e sem esperança. Um espírito já imerso na solidão, alucinadamente triste. Tudo basicamente temperado a piano, voz, baixo e bateria acompanhado  por  seus ex-companheiros  de Mutantes. NADA DE GUITARRA . Só uma salada de rock, bossa nova, samba e MPB desgovernada.

A primeira faixa do LP, a linda balada  "Será Que Eu Vou Virar Bolor?", usando o título como tema, traça ironicamente um paralelo entre o futuro de seu amor e o da música , ambos “ameaçados de extinção”. A seguinte "Uma Pessoa Só", remonta a um sonho  coletivo. "Não Estou Nem Aí" é balada com ares jazzísticos em que, sombreado pela (im)possibilidade de esquecer os "males", ele desafia a morte de forma sarcástica. Em "Vou Me Afundar na Lingerie", um “blues pop” de primeira ele  instala a evasão absoluta do mundo real. A instrumental "Honky Tonky" é um delicioso mergulho no piano.
"Cê tá Pensando Que Eu Sou Loki?", desbanca a loucura, mas não exime “o prazer alucinógeno”. Na balada  ,”Desculpe “que  desvenda a  angústia passional  de uma pessoa atormentada pelo ciúme. " Na fragmentada "Navegar de Novo”  desvenda sua particular  passagem das horas e  dimensões (im)possíveis do tempo. Em  "Te Amo, Podes Crer", uma balada de amor que encarna o pranto de uma pessoa  abandonada e revela: "Dentro de algum tempo eu paro de tocar/espero o apocalipse de então eu te encontrar", um verso que resumiria profeticamente seu futuro. Fechando, a folk-psicodélica "É Fácil", síntese de um  amor absoluto.


Se hoje sua obra é mítica, saiba que Arnaldo pagou muito caro por toda essa paixão,que foi levada às últimas consequências. Emoções, lucidez (e a falta dela) e solidão formam algumas passagens do que significa “Lóki?”. Somos entregues a um comportamento visceral, tão doído quanto raivoso, o que coloca o disco em um pedestal sem igualdade. Dor e angústias  podem ter diminuído, ou até passado. Mas o peso e a inspiração do álbum formaram uma das obras mais instigantes da música brasileira.

domingo, 25 de maio de 2014

Clássicos do Rock Nacional; Selvagem? - Os Paralamas do Sucesso.

O disco “Selvagem?”, d’Os Paralamas do Sucesso, lançado em 1986, não é um disco qualquer. Não pode ser colocado no balaio dos grandes sucessos do Pop Rock brasileiro, tomando-se por base apenas seu marco comercial. Ele vai além do sucesso de vendagem, afinal vendeu muito – mesmo oferecendo algo novo, diferente. Não era o mais do mesmo, era algo novo, era uma aposta, era um risco fazendo o que poderia não ter feito: sucesso.

Em “Cinema Mudo”, de 1983, e “O Passo do Lui”, de 1984, Herbert Vianna (vocal e guitarra), Bi Ribeiro (baixo) e João Barone (bateria), muito jovens, com pouco mais de 20 anos, já mostravam todo seu potencial, tanto no que se refere a fazer legítimos hinos pop – como “Vital e sua moto”, “Meu Erro” e “Romance Ideal” – quanto nas referências a ritmos jamaicanos – vide a própria “Cinema Mudo”, “Ska”, “Óculos” e “Assaltaram a gramática” –, o que mostrava uma peculiaridade muito especial nos três. Embora o grupo de canções que fugiam da lógica pop fosse, até o momento, bem menor, já dava ares das novas perspectivas do grupo. Mas por que mudar, se estava tudo indo tão bem? Aí entra em cena, em 1986, o disco “Selvagem?”, reflexo direto do amadurecimento da banda.
Em 1985, com o fim institucional da ditadura e a abertura política os ares eram de novidade, de esperança, de mudança. Para os Paralamas, era um ano igualmente movimentado. Logo em janeiro, se apresentaram na primeira edição do Rock in Rio, participação que foi fruto do sucesso dos dois primeiros discos. O show foi muito bem recebido pela crítica e pelos fãs. Nos meses que se seguiriam Os Paralamas sairiam pelo Brasil se apresentando em uma turnê bem sucedida. Também em 1985, Os Paralamas do Sucesso vão para a Europa, para alguns shows nos países “costumeiros” de toda turnê internacional. Contudo, o retorno do trio é bem diferenciado dos outros artistas que estiveram juntos na viagem. Antes de voltar ao Brasil, eles passam por alguns países da África e também pela Jamaica. As viagens pelo terceiro mundo, um lugar de gente negra e pobre, pareceu muito familiar aos diversos cantos do Brasil visitados pelos músicos em sua turnê nacional, também em 85. Além disso, em 1984, a banda já havia feito os shows de abertura da turnê brasileira do jamaicano Jymmy Cliff. Tudo isso somou-se e, em 1986, veio “Selvagem?”, onde pesou a responsabilidade típica de quando se faz o que se está afim de fazer, não com falta de compromisso, mas, sim, sem respeitar as amarras do mercado fonográfico.
 

Dizem que quando foi apresentado à banda o riff de guitarra que viria a ser “Alagados”, Bi e João acharam aquilo com cara de samba-enredo. E isso é ruim? Não, eles adoraram. “Alagados” abre o disco avisando logo de cara que as próximas horas serão bem diferentes. E boas.

 O cunho social da letra, muito evidente, é em partes fruto do período que Herbert estudou no Rio de Janeiro e atravessava de ônibus diariamente a Favela da Maré. Depois, já como uma banda de sucesso, conheceram Salvador, capital da Bahia e onde fica Alagados, região periférica da cidade. Um pouco mais tarde, com ainda mais sucesso na bagagem, conheceram Trenchtown, uma favela jamaicana nos subúrbios de Kingston, capital da Jamaica e local onde nasceu Bob Marley. O Brasil, dessa forma, parecia muito mais com a Jamaica, embora muitos tentassem e tentem até hoje negar. São “os filhos da mesma agonia”.  O clipe da música, ousado, confirma tudo isso. O viés popular da vida nas grandes cidades, em ritmo dançante que lembra o samba, convida a todos para cantar as amarguras. Quando o refrão, com break, é sustentado pela batida de tamborins, a evidência grita.


Na sequência vem “Teerã”, ska de características clássicas (assim como muitos outros que virão adiante no disco). A letra faz referência à capital iraniana e principalmente à guerra entre Irã e Iraque (1980 – 1988). O processo traumático que representa uma guerra, principalmente para os civis, é retratado na figura das crianças e o futuro de Teerã. A terceira faixa é “A Novidade”, com letra de Gilberto Gil, que também canta em “Alagados”. O refrão, que é até hoje muito popular, faz menção, novamente, aos desiguais do Brasil. A literalidade forte diz tudo, dispensa explicações: “Oh mundo tão desigual/ Tudo é tão desigual/ De um lado esse carnaval/ Do outro a fome total”.

A quarta música é uma composição de João Barone e Bi Ribeiro. “Melô do Marinheiro” dividiu com “Alagados” a preferência nas rádios em um processo espontâneo. Os fãs gostaram dela, pediram nas rádios e a colocaram para tocar. Não tomou espaço da música de trabalho. Popularizou-se de forma instintiva e virou mais um dos hits do disco. “Marujo Dub”, como o nome já diz, é um Dub baseado na música anterior, o primeiro do disco que, corajoso, já apresenta de cara dois dubs brasileiros às rádios. O segundo é “Teerã Dub”, a última faixa do disco e, igualmente, uma versão de “Teerã”. Os ecos e efeitos na voz saturada, típicos do Dub, assim como a “cara” de remix e a evidência do baixo e da bateria acompanham ambas as faixas. Corajosos e arriscados, os dois dubs são um dos vários marcos do disco.

A sexta faixa é “Selvagem”, música de conteúdo até hoje (quase trinta anos depois)  assustadoramente atual. Nela a letra apresenta, novamente, uma crônica da vida no Brasil e as armas que cada casta dispõe em mãos. Com riff marcante, o mais pesado do disco, Herbert canta sobre a polícia e sua tentativa incansável de manter tudo em seu lugar, custe o que custar. O governo, por sua vez, com seu falatório vazio e seu controle absoluto do poder, construído na base da enganação, mostra a cara de suas armas. Em “E a liberdade cai por terra aos pés de um filme de Godard”, faz-se referência à censura imposta pelo governo Sarney ao filme “Eu te Saúdo, Maria” de Jean-Luc Godard. Na sequência, a cidade apresenta suas armas na forma de mendigos e meninos de rua, enquanto os negros “a esperteza que só tem quem tá cansado de apanhar”.
 “A Dama e o Vagabundo”, a primeira música do disco que traz como tema um relacionamento amoroso. O, porém está no caráter desse relacionamento, que, apesar das diferenças, dá certo. A oitava música é “There’s A Party”. Cantada em inglês, é a que mais se aproxima do pop rock dos dois primeiros discos. Com pouco mais de dois minutos, é a música mais curta. “O Homem”, nona música do disco, apresenta como temática o conflito interior de cada um, colocando em cheque a costumeira dualidade da vida. Questiona o bem e o mal e canta, nenhuma doutrina mais me satisfaz.
 A última música do disco – afinal, “Teerã Dub” não foi incluída na versão original em LP – é uma regravação de “Você/Gostava Tanto de Você”, clássicos de Tim Maia. Sucesso garantido em um reggae que encerra a boa novidade que foi “Selvagem?”.
Definido o lado conceitual do disco, que já vinha sendo trabalhados nos meses finais de 1985, Os Paralamas do Sucesso chamaram Liminha – ex-baixista dos Mutantes e produtor de alguns dos mais aclamados discos do rock brasileiro – para trabalhar a parte técnica. Pelas mãos de Liminha passaram também algumas das segundas guitarras presentes no disco, assim como alguns teclados. Estava garantida a referência técnica da produção, afinal, a experimentação com os novos gêneros musicais deveria estar em excelente qualidade sonora, bem mixada e produzida. Liminha deu conta do recado. Entraram para as gravações em abril e não demoraram mais que um mês para terminar.

 Para a capa do disco foi escolhida uma foto do irmão de Bi que estava colada na parede do local de ensaios. Nela, o jovem Pedro aparece sem camisa, usando-a ao redor da cintura, como uma saia, e segurando um “cajado”. Um índio meio estranho em um dos muitos acampamentos ainda com turma de Brasília, onde Bi e Herbert se conheceram. A estranheza fica completa com o ponto de interrogação que é acrescentado e pergunta: Selvagem?

Em junho de 86 Selvagem? Estava na praça e o resto é história.

Passado o ano de 1986 e todo o sucesso do disco “Selvagem?”, Os Paralamas do Sucesso foram, gradativamente, nos álbuns posteriores mergulhando ainda mais nas referências jamaicanas e caribenhas. 

terça-feira, 20 de maio de 2014

Nheengatu - Titãs

Era grande a expectativa para esse novo álbum dos Titãs. Álbum que segundo a própria banda  seria uma volta ao Cabeça Dinossauro e ao bom punk rock que os Titãs sabem fazer também, talvez não com a mesma fórmula, mas sim com a mesma atitude e essência. Isso me instigou a procurar informações sobre o décimo quarto álbum da banda e o que esperar dele – a capa; obra sobre a Torre de Babel, que segundo o Antigo Testamento (Gênesis 11,1-9), torre construída na Babilônia pelos descendentes de Noé, com a intenção de eternizar seus nomes. A decisão era fazê-la tão alta que alcançasse o céu. Esta soberba provocou a ira de Deus que, para castigá-los, confundiu-lhes as línguas e os espalhou por toda a terra. E o título, “Nheengatu” foi esclarecedor. Língua criada pelos jesuítas para unificar a linguagem indígena assim que chegaram ao Brasil. O conceito do álbum refletiu totalmente o estágio em que nosso país está vivendo, nas palavras do próprio Titãs – “Uma tentativa de fazer uma foto instantânea do Brasil atual, as duas ideias se contrapõem bem: uma palavra (e uma linguagem) de entendimento para tentar explicar um mundo de desentendimento”.


Vamos a primeira faixa, “Fardado” cumpre a promessa. É suja, é pesada, é uma típica música de protesto para abrir o álbum...
Seguindo no disco, temos a ótima “Mensageiro da Desgraça” música um pouco mais difícil de assimilar, assim como as outras músicas cantadas pelo Miklos. As letras dele, em geral, são mais metafóricas e reflexivas, diferente das do Sérgio, que são mais "dedo na cara" e as do Branco, que brincam sempre com contradição e descrição.

“Nheengatu” segue em sua vibe suja, decadente, corrompida e politizada. “República dos Bananas". Um ska, mais pesado que um ska comum, mas mais leve do que as duas primeiras músicas. Remete quase diretamente ao som criado pela banda na época de “Cabeça Dinossauro”.
“Fala Renata” com uma letra incrivelmente simples, pode ser interpretada como uma crítica à futilidade das conversas das pessoas. Pesada em sua essência, tem uma seção no meio de um solinho de teclado onde a levada lembra até um, sei lá, forró. Também tem uma sonoridade muito própria e ao mesmo tempo lembra a sonoridade dos álbuns mais antigos da banda.
 “Canalha” do Walter Franco, é aqui regravada em um ambiente mais 'clean' e como a original apresenta a soturnidade necessária que a faixa pede ,destaque para as guitarras.  Os vocais carregam um nível de dor e descontentamento na medida certa. Ótima faixa, casa muito bem com as canções autorais do álbum, e é uma excelente ponte entre “Cadáver Sobre Cadáver” e “Pedofilia”.


“Pedofilia”, aliás, talvez tenha a letra mais forte do álbum. É explícita, contendo os argumentos de um pedófilo em um vocal semi-sussurrado, mas com um vocal rasgado no refrão, um experimentalismo no meio, uma faixa foda – o peso do punk- rock dos Titãs vêm a tona nessa faixa.

“Chegada ao Brasil (Terra À Vista)” segue, em ritmo com um ótimo baixo na condução da música. A letra suja ironiza os nossos próprios estereótipos.
 “Flores Pra Ela” é fantástica (letra e música), fodamente direcionado aos machistas de plantão que acham que a vida de uma mulher deve ser regrada ao seu bem-querer, mandos e desmandos. Prestem atenção nessa faixa.

Como não podia deixar de ser, em um álbum tão controverso, sobram também críticas a instituições religiosas em “Senhor”. É a indústria e o comercio da fé. Nos tempos atuais a salvação está em qualquer esquina, nas mãos de qualquer um, fazendo os mais humildes entregarem o que tem, em nome de um senhor (com ‘s’ minúsculo) que desconhecem.


O álbum encerra com “Baião de Dois” e “Quem São Os Animais?” da mesma maneira que começou: tecendo críticas ao atual sistema de vida que nos são impostos, os preconceitos que de antemão são enraizados na nossa cultura.
“Quem São os Animais?”, uma música que até parece mais leve que as outras 13, mas a letra mostra um tema atual como nunca. Racismo, homofobia, preconceitos em geral, proferidos pelos ditos seres "racionais"... no fim a gente para e pensa, quem são os animais?
Cheio de criticas sociais, contestador “Nheengatu” pode até soar panfletário nos dias de hoje, em meio a tantos protestos. Mas quer saber? Foda-se. Nheengatu é um álbum que traz de volta a essência do rock.
Pesado, sujo e direto com rock/reggae/ska .


Nheengatu é isso, é porrada, letras pra fazer a gente pensar. Mescla de” Domingo”,” Cabeça Dinossauro” e “Titanomaquia” na receita. Titãs como não se via há muito tempo. Mesmo com metade do time, mostraram que o pulso ainda pulsa.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Dica de Filme - Até o fim.

Até o fim colecionou indicações a prêmios para o seu único ator em cena, Robert Redford, e todo e qualquer prêmio a que tenha sido indicado/ganhado , foi merecido.

 O filme começa com um monólogo em tom de despedida e um objeto flutuando no meio do mar de Sumatra. A trama volta para oito dias antes e estamos com um envelhecido e fora de forma Robert Redford dentro do seu veleiro, que se chocou com um contêiner flutuante perdido de algum navio de carga e está com um rombo no casco. A água está invadindo o barco aos poucos, danificando muitos objetos de comunicação, e o contêiner está preso ao buraco que abriu na embarcação.

Sozinho, o personagem consegue desgarrar o barco do objeto mas há milhares de problemas que ainda estarão por vir: o buraco precisa ser selado; ele está incomunicável no meio do oceano sem saber para onde está indo e travará uma batalha pela sobrevivência – que parece estar perdida de antemão – quando o veleiro é atingido por uma tempestade que se aproxima. Com o naufrágio do barco, o personagem ficará ainda mais perdido no mar, dentro de um bote salva vidas, enquanto é castigado pelo sol e pela força da natureza. À medida que o filme avança, vão se esvaziando todas as esperanças – incluindo a dos espectadores estarrecidos -, a começar com a falta de água potável, a falta de comida, o cerco dos tubarões ao bote e com todos os perigos que o mar oferece. Pior: vibramos com a chegada de dois navios por perto, mas o personagem é invisível às embarcações que trafegam pelas rotas próximas e está se afastando cada vez mais delas.

Filmes de náufrago não são novidade no cinema. A diferença é que aqui praticamente não há diálogos (após o monólogo inicial, o segundo diálogo só vem vinte minutos depois com um pedido de socorro e em seguida, a próxima palavra só será proferida a partir de uma hora) o que faz o filme se aproximar mais do” Náufrago”, com Tom Hanks, no seu desenvolvimento, do que de outros filmes – com a diferença que aqui não temos uma bola de vólei como companhia para o martírio do personagem.

Com uma trilha sonora excelente e eficiente, Até o fim traz uma direção bem calibrada mas que não teria o impacto que tem sem a afiada atuação de Robert Redford, que segura o filme do começo até o final. É uma das melhores atuações de sua carreira, sem dúvidas. Apesar de praticamente não falar, Redford consegue passar sua agonia e desespero com grande verdade, seja nas rugas da idade ou na expressão de resignação, seja no seu esforço físico visível ou na fisionomia de quem não aguenta mais lutar. O fato de estar velho parece adicionar, aliás, um fator importante à trama: toda a atividade no veleiro exige um esforço monumental, como mostrado na luta contra a tempestade que o leva facilmente a exaustão – e quase o mata. Assim, para sobreviver, ele precisa brigar não apenas com a natureza, mas com o destino trágico que o cerca, com o acaso, com a imprevisibilidade do mar, com a solidão, com a própria embarcação que está agonizando prestes a afundar – e, claro, com seu próprio corpo -, o que faz de sua jornada um completo exercício de superação.

O paralelo com o sucesso de 2013, Gravidade, é inevitável. A  essência dos personagens, é a mesma. Se temos na ficção espacial Sandra Bullock perdida na solidão do espaço e desesperada para voltar para casa, aqui temos Redford perdido no meio do oceano, igualmente sozinho e em condições desesperadoras. Qualquer uma das duas situações é aterradora. Ambos aprendem, improvisam, pensam em desistir, contam com um pouco de sorte de última hora, mas, movidos pela fé ou por uma força maior, seguem adiante.
São filmes que nos revelam surpresas sobre o espírito humano, nossa coragem, força, luta e superação dos nossos próprios limites. Aqui o roteiro limpo e simples se sai um pouco melhor nos detalhes do que no filme de Sandra. Ele não usa o personagem para explicar a plateia o que ele faz em cena com palavras – ele traduz tudo em imagens muitas vezes silenciosas, melancólicas, num trabalho extremamente peculiar. Reparem: ao perceber a falta de água, ele improvisa; ao ver um navio se aproximar, ele se revela 
esperançoso em uma fisionomia, que se desfaz logo em seguida ao perceber que não é notado na imensidão azul; o monólogo do começo vira a carta dentro de um pote para quem a encontrar, já que é o momento em que o personagem está entregando os pontos, etc.

Há um ou outro ponto baixo – como no momento em que ele está no bote salva-vidas durante uma tempestade e a confusão da montagem é tão grande que não dá para entender o que está se passando com o personagem. E o final, sem epílogo e meio abrupto, pode não agradar e não ser unanimidade entre os espectadores.

Fica a dica...Filmaço!


AQUI o link de download do torrent

London Calling - The Clash

No final dos anos 70, o punk era um estilo popular, mas ao mesmo tempo era  rejeitado pelos "entendidos" de música. Aliás, tradicionalmente falando, sempre foi assim. O hard rock farofa dos anos 80 também era massacrado, bem como o grunge na década seguinte.
 

O argumento de quem não gostava do gênero, era a falta de criatividade do punk que sempre se resumia em três ou quatro acordes e em alguns casos até o fato de empresários dizerem o que a banda deveria tocar e como ela deveria agir.
Provavelmente por causa dessa herança, o Clash, que já havia lançado dois discos até então, optou pela liberdade de escrever o que quisesse e tocar suas músicas como bem entendesse.
Partindo disso, nasceu London Calling, um dos discos mais conceituais e fundamentais não só da história do rock n' roll, mas da música de um modo geral.
A associação do disco como algo clássico já começa antes mesmo de se dar o play. A capa, que tem Paul Simonon arremessando seu baixo no chão, faz lembrar a capa do não menos clássico Elvis Presley, de 1956.Alem de ser uma síntese, a banda chutava o pau da barraca no que dizia a respeito de ser independente e fazer o que bem entendesse.

"London Calling", apesar de ser um hino do punk, sua levada faz o ouvinte ter uma certeza: O Clash estava anos luz à frente de seu tempo. As guitarras ritmadas em contratempo, o baixo bem marcado e a bateria de certo modo, dançante, fazem remeter a coisas muito posteriores criadas no rock alternativo, fato incontestável.

"Clampdown",  traz como base o punk rock, de três acordes mesmo. Embora, a sua parte mais interessante seja o verso inicial, com o baixo em ritmo quase cavalar e a sequência de acorde em uma espécie de fade-out, dando aquele tom clássico de músicas de fins de um tempo.
"Hateful", é uma das melhores peças não só desse álbum, mas como de toda a carreira da banda.
Em todo caso, London Calling foi muito além apenas do punk, do rock alternativo e do pop. A banda faz uma espécie de viagem à Jamaica, se aventurando por estilos como o reggae e o ska, como na animadíssima "Revolution Rock", que apesar do nome, é um reggae, seu ritmo alegre e sua letra que faz uma espécie de apresentação a essa nova batida.
Aliás, variedade de estilos é o que mais chama a atenção no álbum. Punk, reggae, rockabilly, bebop, ska, R&B, pop, lounge jazz, hard rock e baladas: isso tudo em 19 faixas emocionantes. Começa com a já citada e apocalíptica e hipnótica faixa título, que abre mão do usual verso/refrão/verso ao optar por uma melodia circular forte e impactante. Na seqüência, o rockabilly “Brand New Cadillac", versão para uma canção dos anos 60, de Vincy Taylor. A próxima, "Jimmy Jazz", é um bebop,enquanto o reggae "Rudie Can’t Fail" elogia os jovens que batalharam por seus sonhos nos 60 lutando contra os velhos que os oprimiam. A empolgante "Spanish Bombs" fala sobre a guerra civil espanhola enquanto "The Right Profile" conta o desespero de ser gay na Hollywood dos anos 50 em clima jazz cabaré.

 A ótima e  ácida "Lost in The Supermarket" tem uma bateria marcada tipo la “house music” , para falar, com fina ironia, sobre a alienação e solidão das grandes cidades. "Clampdown" é rock de arena, tanto na melodia quanto na letra. A letra pede para que os jovens não vendam seus sonhos para o mundo frio do capitalismo, enquanto a música é cantada em forma de corrida militar em que os soldados (trabalhadores) se alternam em frases-respostas para o sargento (vocalista). "The Guns of Brixton", única música de Paul Simonon no disco, é reggae pesado e denso. A roqueira "Death or Glory" é o tipo de música em que o título fala por si só, fazendo alusão aos músicos que diziam que iriam morrer antes de ficarem velhos. "The Card Cheat" lembra  Phil Spector entupido de dramaticidade, enquanto "Lover’s Rock" é doce e pop. Para o final, o single não transcrito nem na capa nem no encarte que não iria entrar no disco porque soava tão pop que poderia assustar os punks. Acabou entrando no álbum de última hora, quando a arte do disco já estava toda pronta: "Train in Vain", uma deliciosa balada pop que bateu o numero 23 da parada de singles norte-americana, feito surpreendente para uma canção de origem punk.

 Se fosse preciso escolher os  melhores discos como a obras primas  pop de todos os tempos, este seria um dos  eleitos.
London Calling recebeu tantas criticas positivas que, em 2007, foi introduzido ao Grammy Hall of Fame, uma coleção de gravações de grande qualidade ou relevância histórica. Vale a pena ouvir.


Em suma, London Calling faz uma expedição por vários estilos, imprimindo vários tipos de sons e levando suas letras muito além da simples sede pelo protesto. Ou seja, como já foi dito anteriormente, é um disco fundamental não só do rock. É fundamental para os apreciadores da boa música.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Clássicos do Rock Nacional; Cabeça Dinossauro - Titãs.

O ano é 1986 e os  Titãs tentavam superar problemas  porque um de seus vocalistas, Arnaldo Antunes, e o guitarrista, Tony Beloto, haviam sido presos por envolvimento em heroína. Isso sem dúvida alguma teve influencia direta nas  músicas.

Abril de 86, os Titãs entram no estúdio Nas Nuvens, no Rio de Janeiro para gravar o que seria um clássico, um marco do rock no Brasil: "Cabeça dinossauro", com sonoridade e temática pesadas,diretas e objetivas o que era de certa forma incomum no rock nacional até então.

"Igreja", "Porrada", "Dívidas", "Bichos escrotos", o disco era pancada atrás de pancada . A única faixa que amenizava o tom era  “Família”, o resto fazia jus a capa do disco, que trazia um homem urrando(esboço de uma pintura do  italiano Leonardo Da Vinci).

O álbum fazia trazia  referências  ao episódio de prisão dos integrantes como "Estado violência" e o clássico "Polícia" ("Polícia para quem precisa, polícia para quem precisa de polícia"). Das 13 faixas do álbum, 11 foram muito bem executadas em rádios - como únicas exceções as faixas "A Face do Destruidor" e "Dívidas".
"Bichos Escrotos" acabaria sendo vetada a para audiência em rádios por causa da expressão "Vão se foder!".
"Cabeça dinossauro" fez uma revolução na música brasileira, ninguém tinha feito ainda algo tão pesado e demolidor. O Brasil nunca tivera letras tão diretas e, mais que isso, o disco conseguiu um alto índice de vendas.

"Cabeça Dinossauro", é sem dúvida o mais primal, selvagem, brutal e pesado disco da história do Rock brasileiro. Seu peso não advém de distorções gravíssimas de guitarras ou bateria hipersônica; soa como uma captação do que o ser humano pode produzir de mais pré-histórico em forma de música moderna, e com uma lírica áspera e violenta feita a sonoridade: os Titãs atacavam abertamente pilares considerados sagrados pela sociedade, como a Igreja, o Estado, a Segurança Pública, a família, o sistema bancário... A destruição que o homem causa ao seu próprio planeta também era atacada abertamente, em uma crítica que soa terrivelmente atual até hoje, em todas as suas músicas. Nenhuma perdeu o valor de crítica.

É impossível falar em "Cabeça Dinossauro" e Titãs  sem citar o produtor Liminha, que foi fundamental para a sonoridade do álbum.O produtor que produziu diversos trabalhos dos Titãs teve uma grande importância na historia da banda, e durante muito tempo foi considerado o nono Titã.


Algumas curiosidades envolvem muitas dessas músicas. "O Quê", por exemplo, foi a última ser gravada, devido às imensas dificuldades encontradas pela banda, e foi também a que mais deu trabalho. O arranjo mudou totalmente no estúdio e o Liminha, teve participação decisiva: programou a bateria eletrônica, sugeriu a linha de baixo, tocou guitarra e deixou os músicos  fazendo uma jam interminável durante dois dias até chegar ao resultado final.
Nos shows o até então vocalista Arnaldo Antunes se retirava do palco durante a execução da musica "Igreja". Ele  dizia ter religião e não concordava com o teor da música; ele não aparece no videoclipe da música e se retirava silenciosamente do palco cada vez que a música era executada.
Outra curiosidade diz respeito à gravação de "Polícia". O próprio Sérgio Britto explica: "Outro detalhe curioso, é que gravei a voz solo de 'Polícia' no primeiro take, enquanto o Liminha conversava sobre pesca submarina com o Evandro Mesquita. Talvez isso tenha me ajudado a ficar mais puto ainda e descarregar a raiva durante o vocal. Quando fomos ouvir o resultado, eu queria regravar a voz, a qualquer custo, porque tinha sido muito fácil. Mas todos acabaram me convencendo de que estava bom", explicou o tecladista e vocalista.



O disco marcou o auge dos Titãs na cena roqueira e pode-se afirmar com toda convicção que depois de "Cabeça dinossauro", o rock brasileiro nunca mais foi o mesmo.

domingo, 4 de maio de 2014

Nevermind - Nirvana


Nevermind talvez tenha sido o último clássico indiscutível do rock. E o curioso é que ele foi produzido sem nenhuma pretensão de sequer fazer sucesso. Hoje, vinte e três anos após o lançamento do disco, é possível notar nitidamente a proporção que este álbum tomou.

Em 24 de setembro de 1991, o Nirvana lançava o seu segundo disco, Nevermind,o  álbum é até hoje tido como um dos maiores discos de rock de todos os tempos, e responsável pelo que muitos dizem ser a última grande revolução do rock. Hoje é impossível contar a historia do rock sem reservar um capitulo a Nevermind, e é impossível negar a influência que ele tem até hoje, não só na música, mas no estilo de vida de toda uma geração.

Produzido por Butch Vig, esse foi o primeiro gravado com o baterista Dave Grohl. As letras, todas compostas pelo cantor, e líder Kurt Cobain, eram violentas, radicais, e falavam de temas obscuros como paranóia, e sobre apatia da sua própria geração. Como diria o próprio Cobain, era sobre "Ser de classe média, casar jovem, ter filhos, assistir TV toda noite - e detestar tudo isso".

O álbum começa com Smells Like Teen Spirit, o grande hit do disco e da banda, com seu riff simples de guitarra, e o vocal solitário de Kurt acompanhado pelo baixo de Krist Novoselic. A música segue crescendo até o refrão, quando explode, e Cobain grita toda a sua revolta, e expurga todos os seus sentimentos contra a futilidade de uma geração alienada.
Come As You Are é a terceira faixa, certamente a canção que introduziu o Nirvana no mundo de muita gente. Particularmente, é uma das minhas  preferidas.
Breed, com seu riff chumbado, solo sujo e ritmo alucinado, é das músicas mais empolgantes de Nevermind, enquanto Territorial Pissings é um visceral e inesquecível momento de fúria em forma de música (Kurt destruindo sem piedade sua garganta).
Lithium é a principal representante da dinâmica verso-tranquilo-refrão-porrada que ficou tão associado à banda. Sempre achei isso meio equivocado e superficial, não creio que tal fórmula apareça tão recorrentemente na discografia do grupo. Mas era sem dúvida uma carta na manga de Kurt.
Drain You, Lounge Act e On A Plain são as que com mais inspiração fazem valer a estética punk rock de música com poucos acordes.
Tem também faixas mais tranqüilas como Polly e Something in the Way, essa última que falava dos tempos difíceis que Kurt viveu debaixo da ponte.

 Mas a grande sacada do álbum é a capacidade que Cobain tem de misturar o som de bandas alternativas como Sonic Youth e Pixies com um toque pop, criando músicas que são autênticas,  poderosas e com  refrãos fáceis de assimilar.
Nevermind vendeu mais de 35 milhões de unidades, Smells Like Teen Spirit chegou  ao topo das paradas, desbancando artistas como Michael Jackson e Guns N’ Roses, Madonna e U2. E mais do que isso, o Nirvana provou com seu Nevermind, que uma banda “alternativa” podia chegar ao mainstream, e revolucionou não só o rock, que estava cansado das bandas de “metal farofa” dos anos 80, com seus cabelos enormes e cheios de maquiagem, mas sim toda a indústria musical, que começou a ir atrás de bandas independentes, que agora tinham um espaço garantido nesse meio. Também abriu portas para o sucesso de bandas como Pearl Jam e Soundgarden,Alice in Chains. E colocou Kurt Cobain como um porta-voz dessa geração.


20 anos depois, o Nevermind, o Nirvana, e seu líder se tornaram lenda. Hoje em dia, principalmente com advento da internet, a música independente ganhou muito mais espaço. Mas não há dúvidas, que, mesmo não tendo sido a primeira, talvez nem a mais importante banda alternativa, sem o Nirvana, a música de hoje em dia não seria a mesma. 

quarta-feira, 30 de abril de 2014

Clássicos do Rock Nacional; Dois - Legião Urbana

Sempre fui apaixonado por rock nacional, especialmente das bandas que surgiram nos anos 80/90. Lembro-me do primeiro disco adquirido (presente da minha mãe), Radio Pirata ao Vivo/RPM, Lançado em 1986 e foi  febre naquela época...Tocou pra caramba e vendeu mais ainda. Devido a explosão do rock nacional foi apenas questão de tempo conhecer; Titãs, Ira!, Legião, Paralamas, Engenheiros, Uns e Outros, Nenhum de Nós, Barão Vermelho, Kid Abelha, Heróis da Resistência, Capital, Ultraje à Rigor...
Como em todo movimento musical foi produzido muita música de qualidade e outras nem tanto. Acredito que o que tinha conteúdo e foi relevante permaneceu através do tempo, independente da continuidade das bandas.
A partir de hoje vou tentar fazer um post semanal dedicado aos álbuns considerados clássicos do rock Brazuca.
Pra começar escolhi o álbum “Dois” da Legião Urbana.

O primeiro e (ótimo) trabalho da Legião foi em 1984 e trazia fortes influências do punk e new wave, emplacou sucessos como, Será , Ainda é cedo, Por enquanto...  Porém a consagração viria mesmo com o segundo disco da banda, DOIS, lançado em 1986.

O disco abre com uma gravação ao vivo do trecho final da música “Será”, porém as semelhanças com o primeiro disco param por aí, Dois tem um  clima folk, e com muitas músicas com arranjo semi-acústico em boa parte do álbum.

Daniel na cova dos leões é a segunda “entregada” de Renato Russo sobre sua opção sexual; já em Soldados, do primeiro LP, ele indiretamente mostrava o que se tornaria explícito em  Meninos e meninas de 1989: sua homossexualidade. Daniel..., mostra claramente os conflitos de Renato: “Aquele gosto amargo do seu corpo [...] De amargo então, salgado ficou doce”.

Quase sem querer é um dos hits deste disco, letra triste, melancólica e poética, tudo misturado num arranjo folk inesquecível já na primeira audição.
Acrilic on Canvas evidenciam a influência de bandas como 
Joy Division e New Order. A letra é obscura e mórbida, porém a levada do baixo acompanhadas de teclados casaram bem com o  clima dark da canção.

Eduardo e Mônica foi feita em 1982 e diz a história que  é baseada no caso do antigo produtor executivo da Legião, Rafael Borges, e sua esposa na época . Essa também foi hit absoluto.
Central do Brasil, que possui apenas arranjo instrumental, cria um clima triste e melancólico.

Tempo Perdido talvez tenha a introdução mais conhecida do rock nacional. Nessa faixa  a voz de Russo lembra Morrissey (a maneira que Renato dançava no palco era nitidamente influenciada pelo líder dos Smiths) ,a letra é linda e o final clássico. Logo depois há outro instrumental.
Metrópole lembra a fase  punk da banda.  Dizem que a letra foi amenizada, pois a original era mórbida e suicida.

Música Urbana 2 possui um tom obscuro e uma levada blues.  O número “2” é devido ao fato de o Capital Inicial ter lançado uma música homônima no seu primeiro LP de 1986, com participação de Renato na composição da letra.
Andréa Doria é outra música triste, onde é tratado o tema da separação. Renato está incisivo: “Mas percebo agora que o teu sorriso vem diferente, quase parecendo te ferir”, para concluir de maneira resignada e melancólica: “Nada mais vai me ferir. É que eu já me acostumei, com a estrada que eu segui com minha própria lei”. Deprê total.
Fábrica mostra uma Legião gritante para os problemas sociais, Renato Rocha tocando um baixo exuberante.
Em seguida, Plantas Embaixo do Aquário,  uma das mais estranhas composições da carreira da Legião , ela é bem repetitiva, tendo na verdade poucos versos que não pertencem ao refrão, além de frases em inglês e francês. A letra soa mais como um aviso; Não deixe a guerra começar...
Por fim, Índios, tem um ciclo interessante; o teclado vai subindo juntamente com a voz de Renato, dando a impressão de que um coro inteiro de “índios” canta junto; o refrão figura entre os mais bonitos já compostos por Renato e o final, só com violão e um efeito, é perfeito.


Uma curiosidade; inicialmente, a ideia do grupo era lançar um álbum duplo que se chamaria: “Mitologia e Intuição”, mas a gravadora vetou o projeto, e Dois acabou sendo uma espécie de “catado” das faixas registradas para o projeto original.



Após este disco a Legião lançaria “Que pais é este” retomando a linha punk da banda. Portanto,  Dois torna-se um disco que fecha o ciclo juvenil e inocente da banda, apontando para novos caminhos e novas possibilidades. Além disto, é um dos discos com mais hits juntos que já ouvi.