Era grande a expectativa para esse novo álbum dos Titãs.
Álbum que segundo a própria banda seria
uma volta ao Cabeça Dinossauro e ao
bom punk rock que os Titãs sabem fazer também, talvez não com a mesma fórmula,
mas sim com a mesma atitude e essência. Isso me instigou a procurar informações
sobre o décimo quarto álbum da banda e o que esperar dele – a capa; obra sobre
a Torre de Babel, que segundo o Antigo Testamento (Gênesis 11,1-9), torre
construída na Babilônia pelos descendentes de Noé, com a intenção de eternizar
seus nomes. A decisão era fazê-la tão alta que alcançasse o céu. Esta soberba
provocou a ira de Deus que, para castigá-los, confundiu-lhes as línguas e os
espalhou por toda a terra. E o título, “Nheengatu” foi esclarecedor. Língua
criada pelos jesuítas para unificar a linguagem indígena assim que chegaram ao
Brasil. O conceito do álbum refletiu totalmente o estágio em que nosso país
está vivendo, nas palavras do próprio Titãs – “Uma tentativa de fazer uma foto
instantânea do Brasil atual, as duas ideias se contrapõem bem: uma palavra (e
uma linguagem) de entendimento para tentar explicar um mundo de desentendimento”.
Vamos a primeira faixa, “Fardado” cumpre a promessa. É suja,
é pesada, é uma típica música de protesto para abrir o álbum...
Seguindo no disco, temos a ótima “Mensageiro da Desgraça”
música um pouco mais difícil de assimilar, assim como as outras músicas
cantadas pelo Miklos. As letras dele, em geral, são mais metafóricas e
reflexivas, diferente das do Sérgio, que são mais "dedo na cara" e as
do Branco, que brincam sempre com contradição e descrição.
“Nheengatu” segue em sua vibe suja, decadente, corrompida e
politizada. “República dos Bananas". Um ska, mais pesado que um ska comum, mas
mais leve do que as duas primeiras músicas. Remete quase diretamente ao som
criado pela banda na época de “Cabeça Dinossauro”.
“Fala Renata” com uma letra incrivelmente simples, pode ser
interpretada como uma crítica à futilidade das conversas das pessoas. Pesada em
sua essência, tem uma seção no meio de um solinho de teclado onde a levada
lembra até um, sei lá, forró. Também tem uma sonoridade muito própria e ao
mesmo tempo lembra a sonoridade dos álbuns mais antigos da banda.
“Canalha” do Walter
Franco, é aqui regravada em um ambiente mais 'clean' e como a original apresenta
a soturnidade necessária que a faixa pede ,destaque para as guitarras. Os vocais carregam um nível de dor e
descontentamento na medida certa. Ótima faixa, casa muito bem com as canções autorais
do álbum, e é uma excelente ponte entre “Cadáver Sobre Cadáver” e “Pedofilia”.
“Pedofilia”, aliás, talvez tenha a letra mais forte do álbum.
É explícita, contendo os argumentos de um pedófilo em um vocal semi-sussurrado,
mas com um vocal rasgado no refrão, um experimentalismo no meio, uma faixa foda
– o peso do punk- rock dos Titãs vêm a tona nessa faixa.
“Chegada ao Brasil (Terra À Vista)” segue, em ritmo com um
ótimo baixo na condução da música. A letra suja ironiza os nossos próprios estereótipos.
“Flores Pra Ela” é
fantástica (letra e música), fodamente direcionado aos machistas de plantão que
acham que a vida de uma mulher deve ser regrada ao seu bem-querer, mandos e desmandos.
Prestem atenção nessa faixa.
Como não podia deixar de ser, em um álbum tão controverso,
sobram também críticas a instituições religiosas em “Senhor”. É a indústria e o
comercio da fé. Nos tempos atuais a salvação está em qualquer esquina, nas mãos
de qualquer um, fazendo os mais humildes entregarem o que tem, em nome de um senhor
(com ‘s’ minúsculo) que desconhecem.
O álbum encerra com “Baião de Dois” e “Quem São Os Animais?”
da mesma maneira que começou: tecendo críticas ao atual sistema de vida que nos
são impostos, os preconceitos que de antemão são enraizados na nossa cultura.
“Quem São os Animais?”, uma música que até parece mais leve
que as outras 13, mas a letra mostra um tema atual como nunca. Racismo,
homofobia, preconceitos em geral, proferidos pelos ditos seres
"racionais"... no fim a gente para e pensa, quem são os animais?
Cheio de criticas sociais, contestador “Nheengatu” pode até
soar panfletário nos dias de hoje, em meio a tantos protestos. Mas quer saber?
Foda-se. Nheengatu é um álbum que traz de volta a essência do rock.
Pesado, sujo e direto com rock/reggae/ska .
Nheengatu é isso, é porrada, letras pra fazer a gente
pensar. Mescla de” Domingo”,” Cabeça Dinossauro” e “Titanomaquia” na receita. Titãs
como não se via há muito tempo. Mesmo com metade do time, mostraram que o pulso
ainda pulsa.
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